Poema de Maria do Sameiro Barroso

AS PALAVRAS-PEDRA

O cão dos dias passa por dentro das sombras do tempo,
leva na boca pedaços de cérebro, de coração,
devorados entre estrelas de dendrites desfeitas.
O cão dos dias passa, rouba a água às flores,
o silêncio às aves, o dilúvio aos mortos,
a boca às pedras, a pureza aos rios.

O cão dos dias rouba todas as túnicas brancas,
veste-se de negro.
Com as palavras-pedra ferra os olhos húmidos.

E deixa que te enlace, na música da memória.
As aves voam com o vento.
Por dentro das sílabas mortas, os corpos anseiam
o gemido da terra,
nas flores colocadas fora do lugar.

Maria do Sameiro Barroso

Helena Barbas (ed..) Teresa Salema (org.) Onde o Traço Principia, Literatura e Ambiente, Antologia de literatura portuguesa contemporânea, Where the Trace Begins, Literature and Environment, Anthology of Portuguese Contemporary Literature, Oú le Trait commence, Anthologie de litterature portugaise contemporaine, Donde comienza el Trazo, Literatura y Ambiente, Antologia de literatura portuguesa contemporânea, Lisboa: Pen Clube Português/Edições Colibri, Junho de 2010, pp. 26-27.

Leave A Comment

Pages

Popular Posts